Tempo e outras chuvas
Levava-lhe as cartas duas vezes por semana. As contas e as cartas do banco. No Natal os envelopes de friso azul e vermelho que a família lhe enviava de França. Parava junto ao portão escamado de verde. O homem sentado no alpendre, pousava a navalha e o pedaço de pinho e vinha ter com ele. Entregava-lhe as cartas e perguntava. Então, sempre chove esta semana? Mesmo que fosse Verão. O homem sorria. E encolhia os ombros. O tempo não se adivinha. Sente-se nos ossos, homem. E sentava-se de novo no banco do alpendre a talhar o pedaço de madeira. O carteiro ficava uns momentos perto do portão. E então o homem do alpendre dizia: Ainda não foi desta que ela mandou noticias. Ainda não é desta que ela volta. Duas vezes por semana, ele lhe levava as cartas. E regressava sempre sem noticias. Um dia o homem continuou sentado no banco do alpendre. Doem-me os ossos, disse. Sente-se aqui ao pé de mim. O carteiro entrou. O homem abriu um envelope igual aos que lhe entregava pelo Natal. E leu-lhe a carta dela. Uma carta sem saudades, nem regresso. No fim, dobrou-a e lamentou a dor nos ossos. O carteiro chorava baixinho. E o homem disse, enquanto voltava a talhar o pedaço de madeira. Acho que vai chover.
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5 comentários:
Fantástico.
Com umas qtas linhas, pões-me uma lágrimazinha no olho. ;)
Espero q não chova!
:*
Simples e bonito, tão simples e tão cheio de tudo. Um beijinho para ti, Cristina, e que venhas para ficar
Isabel:
Esperemos que não. Que não chova. :))
Marta:
É um regresso intermitente... bjs
Uma Páscoa cheia de notícias soalheiras :)
Obrigada Pedro :)
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