Não gosto de gatos. Nunca gostei de gatos. Nem nunca percebi o charme nesse animal tão antipático e interesseiro. Quis ter um cão. Mas os meus pais, do alto do 10º andar onde vivíamos nunca me deram hipótese de sonhar com o assunto. Então decidi. O que eu quero mesmo é ter um macaco. Tem juízo e come a sopa. Ó mãe um macaco pequenino, que andasse sempre comigo no meu ombro. E eu aí poderia deslizar pelos telhados da cidade. Visitando as outras águas furtadas. Com o meu macaco no ombro. Mas nós nem temos águas furtadas. Vá, come a sopa. Mas suponhamos, mãe. Apenas. Para isso teria de usar um turbante. E ser indiana. Não, melhor, eu tinha o macaco, e ficava à espera do Ram Dass da janela das minhas águas furtadas. Ram Dass? Quem é o Ram Dass, por amor de Deus? Duas colheres sopa e um encolher de ombros. Suponhamos mãe, suponhamos que eu era como aquela menina da estória, que vivia no sótão. Filha, essa menina, ficou pobre e sozinha. Tu tens muito mais sorte. Não tenho não. Não tenho macaco, nem lareira acesa quentinha a meio de uma noite fria. Não tenho uma amiga chamada Becky, nem uma boneca chamada Emily. Tens outras bonecas, outras amigas, mas com outros nomes. Vá come a sopa. Mas sem esses nomes a estória não é a mesma. Porque são os nomes quem as contam. São os nomes que desenham os rostos, o sorriso claro no rosto escuro do Ram Dass, do outro lado do telhado. E os olhos verdes e grandes da Sara que vêm para além do frio e da tristeza. Porque eu quero um macaco e um vizinho indiano. Ou pelo menos quero sonhar com eles hoje. Fazer de conta que vivem ali, à distancia de um deslizar de telhado. Porque mãe, sem nomes não há estórias. E temos de imaginar. Porque esse é o outro nome que damos ao acreditar.
6 comentários:
O Ram Dass é uma personagem de um livro que marcou muito na infância: "A princesinha". E era realmente um indiano que tinha um macaco. :))
cristina, já olhaste bem para o modo como os gatos se deitam ou brincam? já imaginaste tamanha elegância? e não dão trabalho nenhum. espero que esteja tudo bem.bjo
Olá Helena
Bem sei que os gatos têm um histórico de admiração. Todos lhes reconhecem charme e elegância. Carácter. Mas o que fazer? Sempre gostei de animais simplórios e tontos como os cães e os macacos.
Está tudo bem, obrigada. Quando é que te veremos por cá mais assiduamente?
bjo
Cristina :)
Também chorei e sofri e torci os dedos à força dos apertar com 'A Pricesinha'. Primeiro com o livro, sempre com o livro. Mais tarde com o filme onde vi que a Sara não era nada como a tinha imaginado :)
Foi bom recordar a história. E foi bom ler-te, e sim: imaginar é o outro nome de acreditar :)
Quando vi o filme já era "crescida". E pensei que os senhores que tinha realizado o filme não tinham percebido como é que era REALMENTE a Sara :)
Obrigada Martita
bj
Não perceberam mesmo :)
A sorte é que nós guardamos mais facilmente as imagens que a imaginação cria do que as que nos vendem :)
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